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segunda-feira, 16 de março de 2015

A Primavera chegará


Da varanda da minha casa vejo a Primavera a chegar...

A primavera chegará, mesmo que ninguém mais saiba seu nome, nem acredite no calendário, nem possua jardim para recebê-la. A inclinação do sol vai marcando outras sombras; e os habitantes da mata, essas criaturas naturais que ainda circulam pelo ar e pelo chão, começam a preparar sua vida para a primavera que chega.

Finos clarins que não ouvimos devem soar por dentro da terra, nesse mundo confidencial das raízes, — e arautos sutis acordarão as cores e os perfumes e a alegria de nascer, no espírito das flores.

Há bosques de rododendros que eram verdes e já estão todos cor-de-rosa, como os palácios de Jeipur. Vozes novas de passarinhos começam a ensaiar as árias tradicionais de sua nação. Pequenas borboletas brancas e amarelas apressam-se pelos ares, — e certamente conversam: mas tão baixinho que não se entende.

Oh! Primaveras distantes, depois do branco e deserto inverno, quando as amendoeiras inauguram suas flores, alegremente, e todos os olhos procuram pelo céu o primeiro raio de sol.

Esta é uma primavera diferente, com as matas intactas, as árvores cobertas de folhas, — e só os poetas, entre os humanos, sabem que uma Deusa chega, coroada de flores, com vestidos bordados de flores, com os braços carregados de flores, e vem dançar neste mundo cálido, de incessante luz.

Mas é certo que a primavera chega. É certo que a vida não se esquece, e a terra maternalmente se enfeita para as festas da sua perpetuação.

Algum dia, talvez, nada mais vai ser assim. Algum dia, talvez, os homens terão a primavera que desejarem, no momento que quiserem, independentes deste ritmo, desta ordem, deste movimento do céu. E os pássaros serão outros, com outros cantos e outros hábitos, — e os ouvidos que por acaso os ouvirem não terão nada mais com tudo aquilo que, outrora se entendeu e amou.

Enquanto há primavera, esta primavera natural, prestemos atenção ao sussurro dos passarinhos novos, que dão beijinhos para o ar azul. Escutemos estas vozes que andam nas árvores, caminhemos por estas estradas que ainda conservam seus sentimentos antigos: lentamente estão sendo tecidos os manacás roxos e brancos; e a eufórbia se vai tornando pulquérrima, em cada coroa vermelha que desdobra. Os casulos brancos das gardênias ainda estão sendo enrolados em redor do perfume. E flores agrestes acordam com suas roupas de chita multicor.

Tudo isto para brilhar um instante, apenas, para ser lançado ao vento, — por fidelidade à obscura semente, ao que vem, na rotação da eternidade. Saudemos a primavera, dona da vida — e efêmera.

(Excerto de: "Cecília Meireles - Obra em Prosa - Volume 1")

sábado, 3 de agosto de 2013

Sugeriram-me que fosse ler os porquês de não gostar de Agosto…

Mas o “problema” é que eu gosto de Agosto!
O meu Agosto é acordar de manhãzinha, muito cedo, com o gorjeio das andorinhas pousadas no fio de electricidade junto à janela da casa  onde passo férias.
O meu Agosto tem caminhos sem fim, de terra batida, ladeados de giestas, de onde o calor emana com fragrância a verde. Tem erva a secar ao sol, amarelecida (casa de gafanhotos e pequenas borboletas), de cheiro levemente adocicado e inebriante que desce em declive suave até pequenos lagos de água doce, orlados de canaviais, esconderijos perfeitos para  patos-reais e para  guarda rios, relâmpagos azuis. Tem pinheiros altos onde se ouve o crocitar dos corvos. Tem vinhedos onde as uvas começam a ficar coloridas. Tem avelaneiras que deixam cair as primeiras avelãs, ainda nos invólucros, ainda pálidas, ainda imaturas.
O meu Agosto é feito de campos incultos vigiados por aves de rapina mais rápidas que o meu olhar, quase fantasmas onde só os seus gritos ficam no ar.
O meu Agosto é feito de noites claras de luar azul e outras escuras, de chuva de estrelas como em nenhum outro mês.
O meu Agosto tem o coaxar de rãs junto ao tanque de pedra, tem sol quente, aragens frias e algumas tardes com nuvens escuras e trovoadas passageiras.
O meu Agosto é quase tão breve como as efémeras que sobrevoam os riachos e calmo como o silêncio que antecede a transição da tarde para a noite.
Desculpa, mas eu gosto de Agosto!

quarta-feira, 29 de maio de 2013

Porque ontem foi dia 28 de Maio...

Não há vidas sem dificuldades. Tudo aquilo que vivemos, os momentos menos bons e até o pior dos pesadelos, contribuem para a nossa experiência de vida. É nesses momentos, por nós considerados maus, que devemos descobrir os episódios bons. Estes são lições de vida que sempre nos dão energia e nos fortalecem.

É o sofrimento que nos transforma em pessoas mais fortes, tal como sucede quando, a seguir a um dia cinzento, vem sempre um dia claro com um sol radioso e um lindo céu azul.

A felicidade resulta da forma como reagimos aos obstáculos, da maneira como os enfrentamos e como lidamos com eles de forma a ultrapassá-los. Embora por vezes seja difícil de encontrar, temos de ter presente que existe sempre uma solução para o que nos parece ser o pior dos problemas.



domingo, 6 de fevereiro de 2011

Um passeio a Norte (sentido por um lisboeta)


O sol não demasiado quente empresta calor à aragem salgada e com sabor a maresia da foz do rio Minho em Caminha.
Pequenos barcos de pesca, alguns típicos e coloridos como a bateira, outros mais modernos, de fibra de vidro, repousam no chão lodoso da maré baixa servindo de poiso a gaivotas adormentadas.
No lodo, entre cabos e bóias, ostraceiros, rolas-do-mar e uma garça-branca-pequena competem por alimento num incessante movimento, indiferentes ás pessoas que caminham relativamente perto.
Em frente, na Galiza, o monte de Santa Tecla envolto em nevoeiro tem uma atmosfera misteriosa, avivando os contos de amores infelizes e naufrágios.
Mais para norte, o ferry "Santa Rita de Cássia" aguarda para fazer a travessia até La Guardia.
Seguindo pelo passeio marginal, o pinhal do Camarido atrai-nos com a sua sombra verde e por ele, rapidamente chegamos à praia de Moledo.
Mandado plantar por D. Dinis, o pinhal recebe-nos com frescura e vários caminhos serpenteantes. Momentos de relaxe e descontracção; a riqueza ambiental deste espaço é tal, que se tem tentado a todo o custo proteger certas espécies vegetais, como por exemplo as camarinheiras – "um pequeno arbusto que se desenvolve em terrenos arenosos da orla costeira e produz uma pequena baga comestível, a camarinha".
Mas o murmúrio do vento nos ramos conta-nos de outra forma a história desta planta:
Diz a lenda que El Rei D. Dinis era infiel à sua esposa. A rainha Dona Isabel seguiu-o num dos seus passeios e descobriu a verdade. O pranto foi tanto que as suas lágrimas rolaram até à areia... Daí brotaram pequenos arbustos de onde nasceram bagas, parecidas com pérolas, fazendo lembrar as lágrimas da rainha!
Será verdade? Isto segundo a lenda aconteceu em Leiria, estamos em Caminha.
Não é tão importante assim a veracidade do facto, também vivemos de sonho!
Caminhar em silêncio, usufruir ao máximo cada passo desta beleza natural e um tanto mágica.
Já se consegue ver as dunas de Moledo além, com alguma vegetação nativa como o cardo-marinho e uma planta invasora de origem africana, chamada "chorão-das-praias", de difícil controlo e nefasta para as dunas (nem tudo é perfeito).
De repente, saído do nada, um solitário moinho de vento recorda uma sentinela a guardar a praia.
O areal neste quase anoitecer é um refúgio, onde a calma e o silêncio – somente quebrado pelas ondas do mar – são a melhor terapia para revigorar corpo e mente.
Se fitarmos o mar, o nosso olhar tanto se perde na sua imensidão como se depara com a fortaleza e antigo convento da Ínsua de Santo Isidro, a cerca de duzentos metros da costa.
Esta pequena ilha foi primitivamente utilizada como local de culto (onde segundo a lenda existiria um templo erigido em honra de Saturno). Em época cristã, nela se erguia uma pequena ermida sob a invocação de Nossa Senhora da Ínsua. Posteriormente foi mosteiro e local de defesa da barra.
Actualmente ao abandono, quantas histórias guardará entre as ruínas?
No passeio junto à praia, as luzes dos candeeiros da rua acendem-se.
Já é demasiado tarde para voltar pelo mesmo caminho. Enquanto espero pelo carro que me levará de regresso ao meu destino, olho o mar agora tão escuro e de cor indefinida com pequenos apontamentos laranja de um sol escondido no horizonte.

(este texto é dedicado a uma grande amiga minha, que tal como eu adora o mar)

sexta-feira, 14 de maio de 2010

Aquella casa humilde...


En nuestra casa humilde, tus palabras oí
Que tuviese cuidado y no sufriese con las cosas de este mundo,
Que yo fuese un buen chico, que trabajase mucho,
Que al nombre de mi padre hiciese honor
y nunca fuese un vagabundo
Aun no era día, cuando tú me decías,
Dios te bendiga y guarde se mantenga en tu compañía
Yo te mire a los ojos, la mano te bese,
Te dije amen y en un abrazo te hice oír latir mi corazón
Vida mía, vida mía
Mi padre junto a mí, me acuerdo su emoción,
Veía que las lágrimas mojaban mi chaqueta de algodón
Y todo mi equipaje, en aquella estación,
Era de amor coraje mi fe, mi guitarra, y su bendición
Y en la gran ciudad, tristeza y alegría,
Una nostalgia inmensa y la soledad que aun no conocía
Y el tiempo fue pasando, y entonces comprendí,
Cada palabra tuya en la mañana de aquel día en que partí
Vida mía, vida mía,… vida mía, vida mía,

Llego la primavera, las flores del jardín,
Llenaban de perfume aquellas dulces cartas que llegaban de ti
Y hoy entre sonrisas, podemos recordar,
Y siempre que me acuerdo la emoción me da, deseos de llorar
Vida mía, vida mía,… vida mía, vida mía, recordaciones

Aquella Casa Humilde (Roberto Carlos)




Amo mucho estas canciones de Roberto Carlos, la letra de aquellla casa humilde me hace recordar mi niñez y juventud con esos valores que tanto me gustan y me hacen sentir cosas muy bellas sentiendome feliz.

La de mi querido, mi viejo, mi amigo por supuesto a mi padre y la de Lady Laura a mi madre.

Me hacen pensar y recordar justamente cuándo mis padres me llevaron a FRANCIA…

Y se lo agradezco de corazón « a mis padres, claro ! »
Ahora tengo y amo (mi pais) que se extiende desde el norte de Francia hasta el sur de la Peninsula Iberica..

No podria elegir, pues España es mi madre y Francia es mi padre y Extremadura la tierra que me vio nacer.

No me dediqué a cantar cómo el REY , pero si pude estudiar y trabajar lo que me servio para realizarme y amar muchas cosas, pero ojo cómo todo en la vida, nadie te regala nada y nada fue facil…

(Aún me quedan años de trabajo sobretodo tal como esta la situación ….da para más años !)

Como la filosofía es llevarse bien con la vida intento ser amigo con ella…

Al final la vida te da lo que tu le das a la vida!

Eres amo y dueño de la gestión de tu propia vida, es tu mayor negocio y empresa verdad ?


« Cette autre vie qu'est cette vie dès qu'on se soucie de son âme. »

« Chaque vie se fait son destin. »


CASA DE ROBERTO CARLOS EM CACHOEIRO DE ITAPEMIRIM


quarta-feira, 12 de maio de 2010

Remanso

Vês este rio largo e calmo, com pequenas "ilhotas" cheias de vegetação e pesqueiras em pedra?

Ali, onde o afluente se mistura com ele fazendo "quedas de água" em miniatura, há lajes grandes e tão planas que servem de praia aos poucos banhistas. Mas hoje não há ninguém, já é tarde.

Consegue-se ter uma visão ampla de toda a área envolvente deste pequeno miradouro. Há uma pequena ponte do caminho-de-ferro recuperada, pinheiros e eucaliptos.

Se fechares os olhos ouves e sentes os "sons" todos misturados, mas se te fores concentrando consegues separá-los: primeiro ouves o som da água, depois a aragem nas folhas e o ranger dos ramos. Consegues distinguir o assobio de um melro e o canto de uma rola. Sentes o cheiro das sementes de eucalipto esmagadas pelas rodas das bicicletas que passaram na ecopista.

Com um pouco de sorte, se mantiveres o silêncio e a imobilidade, avistas um guarda-rios a pairar, mergulhar e desaparecer num instante ou um esquilo a saltitar nas árvores, mas para isto é preciso sorte e muito tempo.

A noite está quase aí, são aqueles últimos minutos de luz que ninguém consegue descrever, aquela paz, aquele tempo que se pudesse eu fazia parar.

sábado, 26 de dezembro de 2009

Natal das Sombras

A “equipa” do Farol, Tétis, Poseidón e Argos, desejam a todos os nossos amigos a continuação de umas festas muito felizes!
Este poema é dedicado especialmente a todos aqueles que nestes dias, para além da alegria alusiva a esta quadra, sentem também alguma nostalgia e muito AMOR.
Porque o Natal, citando o poeta Miguel Trigueiros, “É só isso, isso, isso, O AMOR, assim tal e qual.”

Natal das Sombras

Vêm as sombras hoje ter comigo.
Vêm as sombras num cortejo lento.
(Vêm as sombras a pedir-me abrigo
Ou sou eu que as procuro em pensamento?)

Natal das Sombras! Bem o oiço e vejo.
Bem o sinto! Andam passos no caminho...
Chegam todas as sombras num cortejo,
Sentam-se à minha volta, de mansinho...

Primeiro, a sombra de meu Pai... – Meu velho,
Vem aquecer-te, que está frio no Espaço!
Vem dar-me a tua bênção, teu conselho
E o teu abraço... Ah, mas que fundo abraço!

Há tanto tempo que não vinhas! Tanto!
Já na minha lembrança era sol-posto...
Perdoa! Olha as estrelas do meu pranto
Como derramam luz sobre o teu rosto!

Vieste agora, Pai, vieste agora
A festejar comigo o dia eleito,
Na hora da Família, nesta hora
Em que a ausência é presença em cada peito!

A noite de Natal tomba ao de leve
E de mistério a natureza veste...
Lá fora há tanto frio! O luar é neve.
Mas cá dentro há calor – porque vieste…

Natal das Sombras! Tu agora, Avó…
Partiste há pouco mas voltaste cedo…
Não tenho medo. Vem. Eu não estou só.
Chega-te ao pé de mim…Não tenho medo.

Medo de quê? É o Natal das Sombras…
A vida e a morte são a mesma linha.
Mistério dos que voltam: não me assombras.
Chega-te ao pé de mim, boa avozinha!

Foi bom que tu viesses. Mas eu sei:
Não podes demorar-te, com certeza…
Oh avozinha, fica! – Há bolo-rei
E nós cabemos todos nesta mesa…

E agora os tios…Boa noite…Olá!
Sentem-se aqui…Há lume na lareira…
Oh, a alegria enorme que me dá,
Se puderem ficar a noite inteira!

É Dezembro lá fora? Aqui é Maio,
Pois onde entra o amor tudo floresce.
Quereis um golo de cacau? Tomai-o
Bem quentinho! Vá lá, senão ele arrefece…

Porque não falam? Quero ouvir as vozes
Que há tantos anos esqueceram já…
Gostam de doces? Tenho aqui filhozes…
Foram feitas em casa…Provem! Vá!

E agora tu meu filho…Tão pequena
Que a tua sombra franzininha é!
E ao pé dela é tão grande a minha pena…
- Mas ainda é maior a minha fé.

Pousa as tuas mãozitas nos meus ombros.
Não te esqueci, Nem esqueço mais. Descansa.
Tu renasces comigo dos escombros.
Tu renasces comigo em cada esperança.

Encosta a cabecinha nos meus braços.
É Noite de Natal. Meu filho, vem!
Foi longa a caminhada dos espaços,
Mas, agora voltaste…Ainda bem.

E as nossas Mães…A tua e a minha mãe.
Quem, como elas, é connosco? Quem?

E, por último, tu, avô velhinho,
Meu Deus! Estás tão cansado, tão desfeito!
Tão pálido que chegas! Tão curvadinho,
Mas, lá por dentro, sempre tão direito!

Toma esta manta e cobre os teus joelhos.
- Já estamos todos…Como é bom assim!
Agora conversemos. Sim, meus velhos?

Saudade: É o teu Natal dentro de mim.

(Miguel Trigueiros)

sexta-feira, 24 de abril de 2009

Portugal, 24 de Abril de 1974



Há 35 anos atrás, em Portugal, estas canções não podiam ser passadas na rádio:




(do Álbum de 1971 “Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades”)
Letra: Natália Correia (1923-1993)
Música e interpretação: José Mário Branco (1942- )

Queixa das Almas Censuradas

Dão-nos um lírio e um canivete
e uma alma para ir à escola
mais um letreiro que promete
raízes, hastes e corola

Dão-nos um mapa imaginário
que tem a forma de uma cidade
mais um relógio e um calendário
onde não vem a nossa idade

Dão-nos a honra de manequim
para dar corda à nossa ausência.
Dão-nos um prémio de ser assim
sem pecado e sem inocência

Dão-nos um barco e um chapéu
para tirarmos o retrato
Dão-nos bilhetes para o céu
levado à cena num teatro

Penteiam-nos os crânios ermos
com as cabeleiras das avós
para jamais nos parecermos
connosco quando estamos sós

Dão-nos um bolo que é a história
da nossa historia sem enredo
e não nos soa na memória
outra palavra que o medo

Temos fantasmas tão educados
que adormecemos no seu ombro
somos vazios despovoados
de personagens de assombro

Dão-nos a capa do evangelho
e um pacote de tabaco
dão-nos um pente e um espelho
pra pentearmos um macaco

Dão-nos um cravo preso à cabeça
e uma cabeça presa à cintura
para que o corpo não pareça
a forma da alma que o procura

Dão-nos um esquife feito de ferro
com embutidos de diamante
para organizar já o enterro
do nosso corpo mais adiante

Dão-nos um nome e um jornal
um avião e um violino
mas não nos dão o animal
que espeta os cornos no destino

Dão-nos marujos de papelão
com carimbo no passaporte
por isso a nossa dimensão
não é a vida, nem é a morte.


(do Álbum de 1963, "Trova do vento que passa")
Letra: Manuel Alegre (1936- )
Música e interpretação: Adriano Correia de Oliveira (1942-1982)

Trova do Vento que Passa
Pergunto ao vento que passa
notícias do meu país
e o vento cala a desgraça
o vento nada me diz.

Pergunto aos rios que levam
tanto sonho à flor das água
se os rios não me sossegam
levam sonhos deixam mágoas.

Levam sonhos deixam mágoas
ai rios do meu país
minha pátria à flor das águas
para onde vais? Ninguém diz.

Se o verde trevo desfolhas
pede notícias e diz
ao trevo de quatro folhas
que morro por meu país.

Pergunto à gente que passa
por que vai de olhos no chão.
Silêncio -- é tudo o que tem
quem vive na servidão.

Vi florir os verdes ramos
direitos e ao céu voltados.
E a quem gosta de ter amos
vi sempre os ombros curvados.

E o vento não me diz nada
ninguém diz nada de novo.
Vi minha pátria pregada
nos braços em cruz do povo.

Vi minha pátria na margem
dos rios que vão pró mar
como quem ama a viagem
mas tem sempre de ficar.

Vi navios a partir
(minha pátria à flor das águas)
vi minha pátria florir
(verdes folhas verdes mágoas).

Há quem te queira ignorada
e fale pátria em teu nome.
Eu vi-te crucificada
nos braços negros da fome.

E o vento não me diz nada
só o silêncio persiste.
Vi minha pátria parada
à beira de um rio triste.

Ninguém diz nada de novo
se notícias vou pedindo
nas mãos vazias do povo
vi minha pátria florindo.

E a noite cresce por dentro
dos homens do meu país.
Peço notícias ao vento
e o vento nada me diz.

Mas há sempre uma candeia
dentro da própria desgraça
há sempre alguém que semeia
canções no vento que passa.

Mesmo na noite mais triste
em tempo de servidão
há sempre alguém que resiste
há sempre alguém que diz não.

...e Portugal ansiava escutar esta canção...


Letra, música e interpretação: Ermelinda Duarte

Somos livres (Uma gaivota voava, voava)

Ontem apenas
fomos a voz sufocada
dum povo a dizer não quero;
fomos os bobos-do-rei
mastigando desespero.
Ontem apenas
fomos o povo a chorar
na sarjeta dos que, à força,
ultrajaram e venderam
esta terra, hoje nossa.

Uma gaivota voava, voava,
asas de vento,
coração de mar.
Como ela, somos livres,
somos livres de voar.

Uma papoila crescia,
crescia, grito vermelho
num campo qualquer.
Como ela somos livres,
somos livres de crescer.

Uma criança dizia,
dizia"quando for grande
não vou combater".
Como ela, somos livres,
somos livres de dizer.

Somos um povo que cerra fileiras,
parte à conquista
do pão e da paz.
Somos livres, somos livres,
não voltaremos atrás.


Amanhã será outro dia!!!

segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

Argos

Argos…
A primeira vez que ouvi este nome estava deitado com o meu pai, sob um céu escuro pontilhado de luzinhas, numa aldeia alentejana.
Aquelas estrelas não se assemelhavam ás que se viam da minha casa: eram maiores e muito brilhantes.
Sem o "ruído" das luzes artificiais da grande cidade, parecia que se eu erguesse as mãos lhes conseguiria tocar.
O meu pai falava-me das constelações (de ambos os hemisférios) e pedia que eu as imaginasse, depois, chegando a casa, iríamos comparar os desenhos do livro de astronomia com os da minha imaginação.
Argos…Argus...Argo…o navio dos argonautas e a maior constelação do firmamento até o abade francês Nicolas-Louis Lacaille a ter dividido em quatro constelações menores.
Não me importei com o facto e tentei unir os traços entre as estrelas para voltar a formar o navio!
O meu navio, naquela altura já sabia que era meu…
Daí até ao Argos "o construtor", foi um "saltinho"!
De todos os Argos da mitologia grega prefiro este.
Não tinha os poderes dos Deuses para decidir quem vivia ou morria, quem era feliz ou não, mas tinha um talento que lhe permitiu construir o barco que partiu em busca do Velo de Ouro, um talismã, que segundo a lenda, trazia prosperidade a quem o possuísse.
Sozinho não era dado a feitos grandiosos (como algumas figuras mitológicas), mas junto com a tripulação do barco, os argonautas, conseguiu alcançar o objectivo final.
Ora quando este blog foi criado, e o seu nome, assim como o dos outros colaboradores foram escolhidos, pensei que só poderia adoptar o "cognome" de Argos. Porquê?
Três "utopistas" em busca duma quimera guiados por um farol chamado amizade!