Parte 1
Depois de Camilo Pessanha, Teixeira de Pascoaes e Fernando Pessoa, continuaremos os nossos passeios pelo Parque dos Poetas, sempre por ordem cronológica conforme dissemos de início, cabendo agora a vez a Mário de Sá-Carneiro que, tal como os dois primeiros poetas, nos irá acompanhar em “dois passeios”.
Mário de Sá-Carneiro nasce em Lisboa em 19 de Maio de 1890, no seio de uma família abastada da alta burguesia, sendo filho e neto de militares.
Filho único, os primeiros anos da sua vida são marcados pela dor causada pela morte da mãe, que perde aos dois anos de idade. A partir de 1894, o seu pai inicia uma vida de viagens, deixando Mário de Sá-Carneiro entregue aos cuidados dos avós e de uma ama, na Quinta da Victória, em Camarate, às portas de Lisboa. Aí passa grande parte da infância e da adolescência, períodos estes da sua vida muito marcados pela angústia e solidão.
Em 1902, apenas com doze anos, começa a escrever poesia e em 1904, o pai leva-o a visitar França, Suiça e Itália, abrindo-lhe novos horizontes.
Aos quinze anos já traduzia Victor Hugo e aos dezasseis Goethe e Schiller.
Em 1905 escreve e imprime “O Chinó”, jornal satírico da vida escolar, que o pai o impediu de continuar por considerar a publicação excessivamente satírica.
Em 1907 participa como actor, numa récita a favor das vítimas do incêndio da Madalena e no ano seguinte colabora, com pequenos contos, na revista “Azulejos”.
Em 1909 frequenta o Liceu Camões, onde escreve em colaboração com Thomaz Cabreira Júnior a peça “Amizade”. Em 1911, o suicídio de Cabreira Júnior impressiona de tal forma Sá-Carneiro que o leva a escrever e dedicar-lhe o poema “A Um Suicida”.
(...)”A nossa amante era a Glória
Que para ti - era a vitória,
E para mim - asas partidas.
Tinhas esperanças, ambições...
As minhas pobres ilusões
Essas estavam já perdidas...”(…)
Que para ti - era a vitória,
E para mim - asas partidas.
Tinhas esperanças, ambições...
As minhas pobres ilusões
Essas estavam já perdidas...”(…)
Nesse mesmo ano matricula-se na Faculdade de Direito de Coimbra, não chegando, porém, a finalizar o ano lectivo. Inicia, entretanto, a sua amizade com Fernando Pessoa, aquele que foi sem dúvida o seu melhor amigo, aquele que melhor o compreendeu e com quem se identificou.
Em Outubro de 1911 segue para Paris, com o objectivo de continuar os estudos de Direito na Sorbonne. Financiado pelo pai, frequenta o curso irregularmente e nunca se chega a formar.
Na capital francesa passa a dedicar-se mormente à vida de boémia dos cafés e salas de espectáculo, onde convive com Guilherme de Santa-Rita (Santa-Rita Pintor). Socialmente inadaptado e psicologicamente instável, foi neste ambiente que compôs grande parte da sua obra poética e a correspondência com o seu confidente Fernando Pessoa. A sua fugaz mas profícua carreira literário decorre assim entre 1912 e 1916 (o ano da sua morte).
Em 1912 publica a peça teatral "Amizade" e o volume de novelas "Princípio".
Em 1913 escreve, de parceria com António Ponce de Leão, a peça “Alma”. Em1914 publica a novela “A Confissão de Lúcio” e “Dispersão”, poesia.
Entre 1913 e 1914 vem a Portugal com certa regularidade e, numa dessas passagens por Lisboa, começa, conjuntamente com os seus amigos, Almada Negreiros e Fernando Pessoa, entre outros, a delinear a revista literária que se viria a publicar com o nome de Orpheu – revista vanguardista que tanto choque e inspiração causou no seio das elites cultas lisboetas. Daí nasceu a denominada “Geração d’Orpheu” ou “Grupo d’Orpheu”, um verdadeiro escândalo literário à época.
No segundo volume da revista “Orpheu” publica o poema futurista “Manucure”, que ao lado do poema “Ode Triunfal” de Álvaro de Campos, provocam polémica nos meios literários.
“Na sensação de estar polindo as minhas unhas,
Súbita sensação inexplicável de ternura,
Tudo me incluo em Mim – piedosamente.
Entanto eis-me sozinho no Café:
De manhã, como sempre, em bocejos amarelos.
De volta, as mesas apenas – ingratas
E duras, esquinadas na sua desgraciosidade
Bocal, quadrangular e livre-pensadora...
Fora: dia de Maio em luz
E sol – dia brutal, provinciano e democrático
Que os meus olhos delicados, refinados, esguios e citadinos
Nem podem tolerar – e apenas forcados
Suportam em náuseas. Toda a minha sensibilidade
Se ofende com este dia que há-de ter cantores
Entre os amigos com quem ando às vezes –
Trigueiros, naturais, de bigodes fartos –
Que escrevem, mas têm partido político
E assistem a congressos republicanos,
Vão às mulheres, gostam de vinho tinto,
De peros ou de sardinhas fritas...
E eu sempre na sensação de polir as minhas unhas
E de as pintar com um verniz parisiense,
Vou-me mais e mais enternecendo
Até chorar por Mim...”(…)
Ainda em 1915 regressa a Paris, de onde escreve a Fernando Pessoa comunicando a decisão do seu pai de não subsidiar o número 3 da revista “Orpheu”:
“Lord que eu fui de Escócias doutra vida
Hoje arrasta por esta a sua decadência,
Sem brilho e equipagens.
Milord reduzido a viver de imagens,
Pára às montras de jóias de opulência
Num desejo brumoso --- em dúvida iludida...
( - Por isso a minha raiva mal contida,
-Por isso a minha eterna impaciência.)
Olha as Praças, rodeia-as...
Quem sabe se ele outrora
Teve Praças, como esta, e palácios e colunas -
Longas terras, quintas cheias,
Iates pelo mar fora,
Montanhas e lagos, florestas e dunas...
(- Por isso a sensação em mim fincada há tanto
Dum grande património algures haver perdido;
Por isso o meu desejo astral de luxo desmedido -
E a Cor na minha Obra o que ficou do encanto...)”
Agravam-se, por esta altura, as suas crises cíclicas de depressões (aumentadas pelas dificuldades económicas) e em 1916, numa carta a Fernando Pessoa, anuncia a sua intenção de suicídio, o qual viria a suceder a 26 de Abril de 1916, num Hotel de Nice, com vários frascos de estricnina.
Apenas com vinte e seis anos, extravagante tanto na morte como em vida, (de que o poema Fim é um dos mais belos exemplos), convidou para presenciar e testemunhar a sua agonia o seu amigo José de Araújo, que viria a descrever o seu suicídio.
Deixa a Fernando Pessoa a indicação de publicar a obra que dele houvesse, onde, quando e como melhor lhe parecesse.
“Sá-Carneiro não teve biografia: teve só génio. O que disse foi o que viveu." Estas palavras de Fernando Pessoa resumem na perfeição a vida de um grande poeta que escolheu a morte na Primavera da sua vida.
Segue-se um vídeo em que o grupo português “Trovante” interpreta o poema Fim, escrito por Mário de Sá Carneiro em Paris, em 1916.
Fim
Quando eu morrer batam em latas,
Rompam aos saltos e aos pinotes,
Façam estalar no ar chicotes,
Chamem palhaços e acrobatas!
Que o meu caixão vá sobre um burro
Ajaezado à andaluza...
A um morto nada se recusa,
Eu quero por força ir de burro.
Autores do post: Argos e Tétis
Precioso post nos dejas...
ResponderEliminarUna delicia entrar en tu página.
Gracias por compartir tan bello.
Besos.
Queridos voltarei! Agora é mesmo para dizer que teem um presente no meu blogue na página SALA DE MUSICA E PREMIOS.
ResponderEliminarBeijinhos
Flor
"...Depois de Camilo Pessanha, Teixeira de Pascoaes e Fernando Pessoa, continuaremos os nossos passeios pelo Parque dos Poetas, sempre por ordem cronológica conforme dissemos de início, cabendo agora a vez a Mário de Sá-Carneiro que, tal como os dois primeiros poetas, nos irá acompanhar em “dois passeios”..."
ResponderEliminarE, que, "passeio"...Genial. Perfeito.
Admirável.
Parabéns, admirável Amiga.
Mário de Sá-Carneiro era um poeta transcendente na poesia extraordinária e perfeita. Ímpar, só igual aos outros "Poetas do Parque".
Excelente Post, amiga gigante.
Com respeito e estima.
Beijinhos amigos
pena
Que "passeio" fabuloso. Enorme.
Parabéns, amiga!
para ti e Argos
ResponderEliminarVIM DAR UM BEIJINHO
VOU MELHORANDO
A PROCURA
Eu vou caminhando…
Caminhando sem parar…
Caminhando sem olhar para trás.
O andar é longo e espaçado
Porque não quero voltar…
Quero ir – procurar a luz…
Luz que me indique
Um caminho melhor…
Do que o que eu vou percorrendo…
E procuro a verdade…
E caminho para ela…
E procuro a justiça…
E tento abraçá-la…
Mas vejo a fome…
A guerra… e a dor…
E continuo a caminhar…
E a procurar…
Na ânsia de encontrar…
Um mundo melhor!...
Lili Laranjo
Caros Amigos\as:
ResponderEliminarVim agradecer o selo de presente:
Me sinto grato pela visita no meu espaço, que agora serà sempre vosso!
Sempre entro neste espaço: Maravilhoso cheiu de variedade, no qual me sinto em casa.
Parabèns
Os Mèus Melhores Comprimentos
Antònio Manuel
No entiendo bien el portugués, pero creo que estáis haciendo un repaso de los poetas portugueses, y de los tres a los que habéis estudiado esta vez, sólo conozco a Fernando Pessoa, que me encanta!!! Me parece fantática esta labor que estáis haciendo, porque, además de contar las vicisitudes de la vida y la obra de cada poeta, que seguro afectó a su obra, estáis dándonos a conocer una parte muy importante de vuestra cultura, que, al menos para mí, me ayuda a conocer mejor vuestras costumbres, vuestra forma de ser, de ver la vida, de enfrentaros a ella, los acontecimientos que habéis tenido que enfrentar y que os han obligado a tomar unos caminos en vez de otros... Y eso me permite comprenderos mejor y poder acercarme mucho más a vosotros, siempre haciendo un pequeño esfuerzo por entender vuestra lengua, que tampoco es tan difícil...
ResponderEliminar¡¡¡PLAS!!! ¡¡¡PLAS!!! ¡¡¡PLAS!!! Aplaudo vuestra iniciativa y vuestro trabajo, y volveré en unos días a ver quiénes son los protagonistas en esta ocasión... ¡¡¡Me habéis metido el gusanillo por la poesía portuguesa, a mí que adoro la poesís por sí misma!!!
Gracias por compartir!!!
P.D.: Y a ti, Tétis, gracias por tu hermoso comentario, te lo agradezco de corazón... Ahora sólo falta llevarlo a la práctica, y eso sí es de verdad lo complicado...
Beijos
Amigos Argos e Tétis,
ResponderEliminarVou passar com mais tempo para usufruir deste belo post: Mário de Sá-Carneiro?! Imperdivel!
Só passei (ai que correria) para vos dizer que têm um prémio no meu blog. Não sei se já têm (e tempo para confirmar?) mas este é mais do que merecido, ainda que esteja bisado.
Beijinhos para ambos.
A este passeio pelo parque dos poetas não falta nada. Obrigada pelo momento.
ResponderEliminarUm beijo.
Precioso repaso en honor de la poesia portuguesa un placer recordarla y saborearla...muchos besos Tetis y gracias por tus bellos comentarios...los quiero a los cuatro un montonnnnn!!
ResponderEliminarHermosa labor lleváis a cabo
ResponderEliminarretomando las raíces de la poesía
portuguesa para darle más esplendor.
Un placer visitarte, amiga.
un beso
Queridos Argos e Tétis,
ResponderEliminarObrigada por este regresso aos "Os poetas do Parque" e pela possibilidade de relembrar este grande poeta.
Temos, sem sombra de dúvida, uma galeria de Poetas notável.
Se recuarmos no tempo, constatamos que esta contempla vários séculos, de Camões a Pessoa, passando por Pessanha e, mais recentemente Ary, Manuel Alegre e, tantos, tantos outros.
Beijinho para ambos.
Argos e Tétis,
ResponderEliminarÓtima postagem, fiz uma viajem poética na leitura tão interessante!!
Parabéns!!!
Um grande beijo,
Reggina Moon
Passando pra agradecer o carinho e desejar uma linda noite à vocês.
ResponderEliminarUm grande beijo e obrigada mais uma vez.
AMIGOS,
ResponderEliminarque trabajo excellente!
Gracias por dar a conocer los poetas de Portugal..
Es un gusto pasear con vosotros dos..
Beijos, besitos para Tétis, abraços para meu amigo Argos.
() ()
ResponderEliminar( '.' )
(")_(")
HOLAAAAAA, COMO ESTAS? QUERIA DECIRTE QUE TIENES UNOS PREMIOS EN MI MUNDO ANIMAL.
TE ESPERAMOSSSSSS
GRACIASSSS
CHRISSS
hola Meret
ResponderEliminarFicamos felizes que tenhas gostado do nosso post. Fica por cá, pois iremos fazer mais passeios!
Abraços d Tétis e do Argos
Olá Flor
ResponderEliminarÉ sempre um prazer quando nos acompanhas nestes passeios poeticos!
Obrigado pelo presentinho.
Abraçps da Tétis, Poseidón e Argos
Olá Pena
ResponderEliminarDaqui fala o Argos!
É só para te enviar um grande abraço em nome de nós os três, os amigos do Farol.
Tétis, poseidón e Argos
Nobres colegas,
ResponderEliminarOutra bela pesquisa literária. Gostaria de saber o real motivo da cabeça pendente da escultura.
Um grande abraço
Olá Lili
ResponderEliminarAinda bem que estás a melhorar, estamos a torcer para que fiques bem de todo!
Obrigado pelo poema. Todos temos a nossa demanda...
Abraço da Tétis e do Argos
António Manuel
ResponderEliminarÉs sempre bem-vindo no nosso Farol!
Aparece sempre que quiseres e muito obrigado pelas palavras simpáticas.
Abraço da Tétis e do Argos
Angelet
ResponderEliminarSe continuares connosco até ao fim do passeio pelos "Poetas do Parque", prometemos que aprendes português e muitos poemas emblemáticos do nosso país!
Obrigado pela tua simpatia
Beijos da Tétis e abraços do Argos
Olá Teresa
ResponderEliminarObrigado pela visita e pelo prémio!
Continua connosco no passeio, verás que encontras outros teus poetas preferidos!
abraços da Tétis e do Argos
Graça
ResponderEliminarObrigado pela simpatia do seu comentário!
Quanto aos momentos...também temos que lhe agradecer pelos que tão bem passamos no seu blog.
Abraço da Tétis e do Argos
Arwen
ResponderEliminarA tétis agradece e retribui o beijo e eu e o Poseidón enviamos um grande abraço.
Aparece sempre!
Hola Jesus
ResponderEliminarPara nós é um prazer revisitar e trazer para o nosso blog estes grandes vultos da poesia portuguesa, temos pena de não conseguir colocar todos!
Abraço da Tétis e do Argos
Olá Reggina
ResponderEliminarA viagem pelo parque ainda não terminou!
Mas agora é a nossa vez de viajar pelos poemas escolhidos por ti no teu blog, obrigado e um grande abraço da
Tétis e do Argos
Serena Flor
ResponderEliminarNós é que agradecemos o carinho e simpatia que nos deixa sempre que aqui vem!
Uma óptima semana
Abraço da Tétis e do Argos
Amigo Poseidón
ResponderEliminarObrigado pelo apoio!
Podemos lançar-te um repto?
Gostaríamos de saber qual o teu outro poeta português preferido ( não vale dizer Fernando Pessoa, esse já nos sabemos)e já agora um poemazito?
beijos da Tétis e abraços do Argos
Hola Christian
ResponderEliminarObrigado pelo prémio e uma óptima semana!
Abraço da Tétis e do Argos
Amigo Mar
ResponderEliminarBoa observação!
Para falar verdade não sei o motivo da cabeça pendente na escultura, talvez pela sua forma de encarar a vida?
Mas desde já prometemos "investigar"!
Abraço da Tétis e do Argos